AULA DE FILOSOFIA 2º ANO ENSINO MÉDIO, M, T E N.
Hegel - A Dialética
GEORG
WILHELM FRIEDRICH HEGEL - A
dialética para Hegel é o procedimento superior do pensamento é, ao mesmo tempo,
repetimo-la, "a marcha e o ritmo das próprias coisas". Vejamos, por
exemplo, como o conceito fundamental de ser se enriquece dialeticamente. Como é
que o ser, essa noção simultaneamente a mais abstrata e a mais real, a mais
vazia e a mais compreensiva (essa noção em que o velho Parmênides se fechava: o
ser é, nada mais podemos dizer), transforma-se em outra coisa? É em virtude da
contradição que esse conceito envolve. O conceito de ser é o mais geral, mas
também o mais pobre. Ser, sem qualquer qualidade ou determinação - é, em última
análise, não ser absolutamente nada, é não ser! O ser, puro e simples, equivale
ao não-ser (eis a antítese). É fácil ver que essa contradição se resolve no
vir-a-ser (posto que vir-a-ser é não mais ser o que se era). Os dois contrários
que engendram o devir (síntese), aí se reencontram fundidos, reconciliados.
Vejamos um exemplo muito célebre da
dialética hegeliana que será um dos pontos de partida da reflexão de Karl Marx.
Trata-se de um episódio dialético tirado da Fenomenologia do Espírito, o do
senhor e o escravo. Dois homens lutam entre si. Um deles é pleno de coragem.
Aceita arriscar sua vida no combate, mostrando assim que é um homem livre,
superior à sua vida. O outro, que não ousa arriscar a vida, é vencido. O
vencedor não mata o prisioneiro, ao contrário, conserva-o cuidadosamente como
testemunha e espelho de sua vitória. Tal é o escravo, o "servus",
aquele que, ao pé da letra, foi conservado.
a) O senhor obriga o escravo, ao
passo que ele próprio goza os prazeres da vida. O senhor não cultiva seu
jardim, não faz cozer seus alimentos, não acende seu fogo: ele tem o escravo
para isso. O senhor não conhece mais os rigores do mundo material, uma vez que
interpôs um escravo entre ele e o mundo. O senhor, porque lê o reconhecimento
de sua superioridade no olhar submisso de seu escravo, é livre, ao passo que
este último se vê despojado dos frutos de seu trabalho, numa situação de
submissão absoluta.
b) Entretanto, essa situação vai
se transformar dialeticamente porque a posição do senhor abriga uma contradição
interna: o senhor só o é em função da existência do escravo, que condiciona a
sua. O senhor só o é porque é reconhecido como tal pela consciência do escravo
e também porque vive do trabalho desse escravo. Nesse sentido, ele é uma
espécie de escravo de seu escravo.
c) De fato, o escravo, que era
mais ainda o escravo da vida do que o escravo de seu senhor (foi por medo de
morrer que se submeteu), vai encontrar uma nova forma de liberdade. Colocado
numa situação infeliz em que só conhece provações, aprende a se afastar de
todos os eventos exteriores, a libertar-se de tudo o que o oprime,
desenvolvendo uma consciência pessoal. Mas, sobretudo, o escravo
incessantemente ocupado com o trabalho, aprende a vencer a natureza ao utilizar
as leis da matéria e recupera uma certa forma de liberdade (o domínio da
natureza) por intermédio de seu trabalho. Por uma conversão dialética exemplar,
o trabalho servil devolve-lhe a liberdade. Desse modo, o escravo, transformado
pelas provações e pelo próprio trabalho, ensina a seu senhor a verdadeira
liberdade que é o domínio de si mesmo. Assim, a liberdade estóica se apresenta
a Hegel como a reconciliação entre o domínio e a servidão.
Hegel parte, fundamentalmente, da
síntese a priori de Kant, em que o espírito é constituído substancialmente como
sendo o construtor da realidade e toda a sua atividade é reduzida ao âmbito da
experiência, porquanto é da íntima natureza da síntese a priori não poder, de modo nenhum, transcender a
experiência, de sorte que Hegel se achava fatalmente impelido a um monismo
imanentista, que devia necessariamente tornar-se panlogista, dialético. Assim,
deviam se achar na realidade única da experiência as características divinas do
antigo Deus transcendente, destruído por Kant. Hegel devia, portanto, chegar ao
panteísmo imanentista, que Schopenhauer, o grande crítico do idealismo
racionalista e otimista, declarará nada mais ser que ateísmo imanentista.
No entanto, para poder elevar a
realidade da experiência à ordem da realidade absoluta, divina, Hegel se achava
obrigado a mostrar a racionalidade absoluta da realidade da experiência, a
qual, sendo o mundo da experiência limitado e deficiente, por causa do assim
chamado mal metafísico, físico e moral, não podia, por certo, ser concebida
mediante o ser (da filosofia aristotélica), idêntico a si mesmo e excluindo o
seu oposto, e onde a limitação, a negação, o mal, não podem, de modo nenhum,
gerar naturalmente valores positivos de bem verdadeiro. Mas essa racionalidade
absoluta da realidade da experiência devia ser concebida mediante o vir-a-ser
absoluto (de Heráclito), onde um elemento gera o seu oposto, e a negação e o
mal são condições de positividade e de bem.
Apresentava-se, portanto, a
necessidade da invenção de uma nova lógica, para poder racionalizar o elemento
potencial e negativo da experiência, isto é, tudo que há no mundo de arracional
e de irracional. E por isso Hegel inventou a dialética dos opostos, cuja
característica fundamental é a negação, em que a positividade se realiza
através da negatividade, do ritmo famoso de tese, antítese e síntese. Essa
dialética dos opostos resolve e compõe em si mesma o elemento positivo da tese
e da antítese. Isto é, todo elemento da realidade, estabelecendo-se a si mesmo
absolutamente (tese) e não esgotando o Absoluto de que é um momento, demanda o
seu oposto (antítese), que nega e o qual integra, em uma realidade mais rica
(síntese), para daqui começar de novo o processo dialético. A nova lógica
hegeliana difere da antiga, não somente pela negação do princípio de identidade
e de contradição - como eram concebidos na lógica antiga - mas também porquanto
a nova lógica é considerada como sendo a própria lei do ser. Quer dizer,
coincide com a ontologia, em que o próprio objeto já não é mais o ser, mas o
devir absoluto.
Dispensa-se acrescentar como, a
experiência sendo a realidade absoluta, e sendo também vir-a-ser, a história em
geral se valoriza na filosofia; igualmente não é preciso salientar como o
conceito concreto, isto é, o particular conexo historicamente com o todo, toma
o lugar do conceito abstrato, que representa o elemento universal e comum dos
particulares. Estamos, logo, perante um panlogismo, não estático, como o de
Spinoza, e sim dinâmico, em que - através do idealismo absoluto - o monismo,
que Hegel considerava panteísmo, é levado às suas extremas consequências
metafísicas imanentistas.
Podemos resumir assim:
1.° - A lógica tradicional afirma
que o ser é idêntico a si mesmo e exclui o seu oposto (princípio de identidade
e de contradição); ao passo que a lógica hegeliana sustenta que a realidade é
essencialmente mudança, devir, passagem de um elemento ao seu oposto;
2.° - A lógica tradicional afirma
que o conceito é universal abstrato, enquanto apreende o ser imutável,
realmente, ainda que não totalmente; ao passo que a lógica hegeliana sustenta
que o conceito é universal concreto, isto é, conexão histórica do particular
com a totalidade do real, onde tudo é essencialmente conexo com tudo;
3.° - A lógica tradicional
distingue substancialmente a filosofia, cujo objeto é o universal e o imutável,
da história, cujo objeto é o particular e o mutável; ao passo que a lógica
hegeliana assimila a filosofia com a história, enquanto o ser é vir-a-ser;
4.° - A lógica tradicional
distingue-se da ontologia, enquanto o nosso pensamento, se apreende o ser, não
o esgota totalmente - como faz o pensamento de Deus; ao passo que a lógica
hegeliana coincide com a ontologia, porquanto a realidade é o desenvolvimento
dialético do próprio "logos" divino, que no espírito humano adquire
plena consciência de si mesmo.
Visto que a realidade é o vir-a-ser
dialético da Ideia, a autoconsciência racional de Deus, Hegel julgou dever
deduzir a priori o desenvolvimento lógico da ideia, e demonstrar a necessidade
racional da história natural e humana, segundo a conhecida tríade de tese,
antítese e síntese, não só nos aspectos gerais, nos momentos essenciais, mas em
toda particularidade da história. E, com efeito, a realidade deveria
transformar-se rigorosamente na racionalidade em um sistema coerente de
pensamento idealista e imanentista.
Não é mister dizer que essa história
dialética nada mais é que a história empírica, arbitrariamente potenciada
segundo a não menos arbitrária lógica hegeliana, em uma possível assimilação do
devir empírico do desenvolvimento lógico - ainda que entendido dialeticamente,
dinamicamente. Tal história dialética deveria, enfim, terminar com o advento da
filosofia hegeliana, em que a Ideia teria acabado a sua odisseia, adquirindo
consciência de si mesma, isto é, da sua divindade, no espírito humano, como
absoluto. Mas, desse modo, viria a ser negada a própria essência da filosofia
hegeliana, para a qual o ser, isto é, o pensamento, nada mais é que o infinito
vir-a-ser dialético.
Referências Bibliográficas:
DURANT, Will. História da Filosofia - A Vida e as Ideias dos
Grandes Filósofos, São Paulo, Editora Nacional, 1.ª edição, 1926.
FRANCA S. J. Padre Leonel, Noções de História da Filosofia.
PADOVANI, Umberto e CASTAGNOLA, Luís. História da Filosofia,
Edições Melhoramentos, São Paulo, 10.ª edição, 1974.
VERGEZ, André e HUISMAN, Denis. História da Filosofia Ilustrada
pelos Textos, Freitas Bastos, Rio de Janeiro, 4.ª edição, 1980.
JAEGER, Werner. Paidéia - A Formação do Homem Grego, Martins
Fontes, São Paulo, 3ª edição, 1995.
Coleção Os Pensadores. Georg Wilhelm Friedrich Hegel - Estética: A
Ideia e o Ideal - Estética: O Belo Artístico ou o Ideal, Nova Cultural, São
Paulo, 1999.
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