Sinopse do livro O que
é Ideologia de Marilena Chauí?
Pelo Prof. Edson de Souza Couto
Graduado em Licenciatura Plena em História ULBRA/TORRES
Pós-Graduado em Ensino de Filosofia e Sociologia
UNIASSELVI/CAPÃO DA CANOA
O que é ideologia
A autora
Marilena Chauí inicia o livro “o que é ideologia” abordando a definição do que
é ideologia e nos apresenta também alguns caminhos pelos quais a ideologia
burguesa passou até chegar a seu estágio atual e explica que, para ela,
ideologia é um conjunto sistemático e encadeado de ideias de forma que essa
ideologia representa um ideário histórico, social e político que oculta à
realidade e que esse ocultamento aponta uma forma de assegurar e manter a
exploração econômica, a desigualdade social e a dominação política.
Marilena
introduz seus conceitos remontando ao pensamento filosófico da Grécia Antiga
sobre o que ocasiona o movimento do ser. Em seguida, faz uma analogia à teoria
das quatro causas de Aristóteles, afirmando que são mais importantes as causas
de permanência e menos importantes às causas de mudança ou movimento. Ela
afirma também que a teoria da causalidade no mundo moderno, reforçada pelos
pensamentos de Galileu, Bacon e Descartes, foi reduzida a apenas duas causas: a
eficiente e a final.
As quatro
causas explicam a permanência e o movimento ou mudança, um aspecto fundamental
da teoria da causalidade que consiste no fato de que as quatro causas não
possuem o mesmo valor. A teoria das quatro causas faz distinção entre dois
tipos de atividades: a atividade técnica – poiésis e a atividade ética e
política – práxis.
De acordo com
Chauí, a física moderna trouxe-nos a possibilidade de explicar o corpo humano
pela anatômica e fisiologicamente. Com o objetivo de representar uma máquina
natural e impessoal que obedece à causalidade eficiente surgiu o homem como um
ser peculiar que será valorizado pela ética protestante tornando-se um
indivíduo moderno. Além do homem burguês descobre-se outro; o trabalhador
livre.
O homem
mescla-se em dois diferentes tipos de homens; o burguês, proprietário privado
dos meios de produção e há o trabalhador, despojado desses meios e dessas
condições de trabalho. Os trabalhadores "livres" fazem parte da
natureza, enquanto os burgueses constituem a sociedade.
Marilena Chauí diz que o idealista considera
o real como ideias ou representações e que o conhecimento da realidade se reduz
ao exame dos dados e das operações de nossa consciência ou do intelecto, como
atividade produtora de ideias que dão sentido ao real e o fazem existirem para
nós. Para o empirista a realidade é um puro dado imediato e para o idealista um
dado da consciência. A autora Chauí ressalta que a história não é sucessão de
fatos no tempo, nem o progresso das ideias, mas o modo como homens determinados
criam os meios e as formas de sua existência social que se transformam em
econômica, política e cultural.
Para Marilena
Chauí a história é o real, e o real é o movimento incessante pelo qual os
homens em condições indesejáveis instauram um modo de sociabilidade e procuram
fixá-lo em instituições determinadas, além dessas fixações sociais os homens
produzem ideias pelas quais explicam e compreendem sua própria vida individual,
social, suas relações com a natureza e com o sobrenatural. Nas sociedades
divididas em classes e também em castas essas ideias são reproduzidas e
difundidas pela classe dominante com intuito de legitimar e assegurar seu poder
econômico, social e político.
A autora
Marilena Chauí descreve como surgiu o termo ideologia; o termo ideologia aparece
pela primeira vez em 1801 no livro de Destutt de Tracy, Elementos de Ideologia.
Foi o Destutt de Tracy que elaborou uma teoria sobre as faculdades sensíveis,
responsáveis pela formação de todas as nossas ideias: querer (vontade), julgar
(razão), sentir (percepção) e recordar (memória). Destutt de Tracy pertencia ao
grupo de pensadores que eram: antiteológico, antimetafísico, críticos a toda
explicação sobre uma origem invisível e espiritual das ideias humanas e
inimigos do poder absoluto dos reis, eram também materialistas e pertenciam ao
partido liberal e esperavam que o progresso das ciências experimentais,
baseadas exclusivamente na observação, na análise e síntese dos dados
observados, pudesse levar a uma nova pedagogia e a uma nova moral.
Em seguida
Destutt de Tracy propõe o ensino das ciências físicas e químicas para “formar
um bom espírito”, dos elementos de ideologia ele procura analisar os efeitos de
nossas ações voluntárias e escreve, então, sobre economia, na medida em que os
efeitos de nossas ações voluntárias concernem à nossa aptidão para prover
nossas necessidades materiais. O sentido pejorativo dos termos “ideologia” e
“ideólogos” vieram de uma declaração de Napoleão que, num discurso ao Conselho
de Estado em 1812, declarou: “Todas as desgraças que afligem” nossa bela França
devem ser atribuídas à ideologia, essa tenebrosa metafísica que, buscando com
sutilezas as causas primeiras, quer fundar sobre suas bases a legislação dos
povos, em vez de adaptar as leis ao conhecimento do coração humano e às lições
da história. Aponta-se também que tal termo foi empregado por Augusto Comte em
“Curso de Filosofia Positiva” e explica sucintamente que, para os positivistas,
ideologia era um conjunto de ideias de uma época, em que eles afirmavam que “o
poder pertence a quem possui o saber” e que quando as ações humanas
contrariassem as ideias, elas seriam tidas como desordem, o que contrariava o
lema da sociedade positivista de “Ordem e Progresso”.
De acordo com
Chauí, Durkheim chama de ideologia; um resto, uma sobra de ideias antigas,
pré-científicas que ele as considera como preconceitos e pré-noções inteiramente
subjetivas, individuais, “noções vulgares”, pois, considera tal atitude subjetiva e tradicional.
Para ele o grande princípio metodológico que permite tratar o fato social como
coisa e liberar o cientista da ideologia é: “Tomar sempre para objeto da
investigação um grupo de fenômenos previamente isolados e definidos por
características exteriores que lhe sejam comuns e incluir na mesma investigação
todos os que correspondem a essa definição”. Assim, o fato social, convertido
em coisa científica, nada mais é do que um dado, previamente isolado,
classificado e relacionado com outros por meio da semelhança ou constância das
características externas.
A IDEOLOGIA DA
COMPETÊNCIA
Marilena Chauí afirma que, o Filósofo francês
Claude Lefort escreveu a ideologia burguesa como um pensamento e um discurso de
caráter legislador, ético e pedagógico que definia para toda a sociedade o
verdadeiro e o falso, o bom e o mau, o lícito e o ilícito, o justo e o injusto,
o normal e o patológico, o belo e o feio, a civilização e a barbárie. A partir
dos anos 30 do século XX houve uma mudança no processo social do trabalho, o
trabalho industrial passou a ser conhecido como fordismo, no qual uma empresa
controla desde a produção da matéria prima até a distribuição comercial dos
produtos. Com o Fordismo foi introduzida uma nova prática das relações sociais,
conhecida como a organização no sentido de administrar, racionalizar se for
eficiente e como administração científica racional que possui lógica própria e
funciona por si mesma. A organização do trabalho industrial dividiu-se em duas
novidades: a linha da montagem e a gerência científica.
Lefort cita
na ideologia contemporânea como a ideologia invisível emana diretamente do
funcionamento da organização e das chamadas “leis do mercado”. A ideologia da
competência domina pelo descomunal prestígio e poder conferidos ao conhecimento
científico e tecnológico e o discurso competente é aquele proferido pelo
especialista que ocupa uma posição determinada na hierarquia organizacional. Na
outra modalidade o discurso da competência é privatizado refere-se aquele que
ensina enquanto indivíduos privados e não enquanto sujeitos sociais ao
relacionarmos com o mundo e com os outros. Os dois discursos foram construídos
para assegurar 02 pontos indissociáveis do modo de produção capitalista: a
existência da racionalidade nas leis de mercado; e que só há felicidade na
competição e no sucesso de quem vence a competição.
A ideologia
tem a função de dar aos membros de uma sociedade dividida em classes uma
explicação racional para as diferenças sociais, políticas e culturais, sem
jamais atribuir tais diferenças à divisão da sociedade em classes, a partir das
divisões na esfera da produção. é a de apagar as diferenças como de classes e
de fornecer aos membros da sociedade o sentimento da identidade social,
encontrando certos referenciais identificadores de todos e para todos, como,
por exemplo, a Humanidade, a Liberdade, a Igualdade, a Nação, ou o Estado.
Podemos cometer um engano, contrapondo ideologia e crítica da ideologia, e
podemos contrapor a ideologia ao saber real que muitos dominados têm acerca da
realidade da exploração, da dominação, da divisão social em classes e da
repressão a que este saber está submetido pelas forças repressivas dos
dominantes (forças repressivas que não precisam ser apenas as da polícia ou as
do exército, mas que podem ser sutilmente, a própria ideologia difundida e
conservada pela escola e pelas ciências ou filosofias dos dominantes).
Marilena Chauí
ressalta que é indispensável ver na ideologia do sistema capitalista os três
tipos diferentes de família (diferentes tanto por sua finalidade como por seu
modo de organização), a burguesa, a proletária e a pequeno-burguesa, já não poderiam
falar: a Família. Se pudesse mostrar que a família burguesa é um contrato
econômico entre duas outras famílias para conservar e transmitir o capital sob
a forma de patrimônio familiar e de herança (mantendo a classe) teria que
mostrar que é por isso que, nessa família, o adultério feminino é uma falta
grave, pois faz surgirem herdeiros ilegítimos que dispersariam o capital
familiar, e que, por este motivo, o adultério feminino é convertido, para a
sociedade inteira, numa falta moral e num crime penal. Se, por exemplo, pudesse
mostrar que a família proletária tem por função exclusiva reproduzir a
força-de-trabalho procriando filhos, teria que mostrar que é por isso (e não
por razões religiosas e morais, que justamente são ideológicas) que a mulher
proletária não tem direito ao aborto decente e nem o direito ao anticoncepcional,
a não ser quando, em virtude da modificação tecnológica que leva à automação do
trabalho, interessa aos dominantes diminuir a quantidade de oferta de mão de
obra no mercado de trabalho. Se a ideologia mostrasse todos os aspectos que
constituem a realidade das famílias no sistema capitalista, se mostrasse como a
repressão da sexualidade está ligada a essas estruturas familiares (condenação
do adultério, do homossexualismo, do aborto, defesa da virgindade e do
heterossexualismo, diminuição do prazer sexual para o trabalhador porque o sexo
diminui a rentabilidade e produtividade do trabalho alienado), como, então, a
ideologia manteria a ideia e o ideal da Família? Como faria, por exemplo, para
justificar uma sexualidade que não estivesse legitimada pela procriação, pelo
Pai e pela Mãe? Não pode fazer isto. Não pode dizer isto; porque a ideologia
não tem história, mas fabrica histórias imaginárias que nada mais são do que
uma forma de legitimar a dominação da classe dominante compreende-se por que a
história ideológica (aquela que aprendemos na escola e nos livros) é sempre uma
história narrada do ponto de vista do vencedor ou dos poderosos que é
transformado em único sujeito da história não só porque impediu que houvesse a
história dos vencidos (ao serem derrotados, os vencidos perderam o “direito” à
história), mas simplesmente porque sua ação histórica consiste em eliminar
fisicamente os vencidos ou, então, se precisa do trabalho deles, elimina sua
memória, fazendo com que se lembrem apenas.
Chauí encerra
a obra criticando a supremacia histórica dos “grandes homens”, dos “grandes
feitos”, das “grandes descobertas”, dos “grandes progressos”, a ideologia nunca
nos diz o que são esses “grandes”. Grandes em quê? Grandes por quê? Grandes em
relação a quê? No entanto, o saber histórico nos dirá que esses “grandes”,
agentes da história e do progresso, são os “grandes e poderosos”, isto é, os
dominantes, cuja “grandeza” depende sempre da exploração e dominação dos
“pequenos”, Aliás, a própria ideia de que os outros são os “pequenos” já é um
pacto que fazemos com a ideologia dominante.
Com base nos
estudos históricos levantados concluímos que a ideologia burguesa pode manter
sua hegemonia mesmo sobre os vencidos, pois estes interiorizam a suposição de
que não são sujeitos da história, mas apenas indivíduos explorados.
Referência
-CHAUÍ, M. O que é Ideologia. São Paulo: Brasiliense. 2001.
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