segunda-feira, 21 de abril de 2014

Sinopse do livro O que é Ideologia de Marilena Chauí?

Pelo Prof. Edson de Souza Couto
Graduado em Licenciatura Plena em História ULBRA/TORRES
Pós-Graduado em Ensino de Filosofia e Sociologia UNIASSELVI/CAPÃO DA CANOA

O que é ideologia
          A autora Marilena Chauí inicia o livro “o que é ideologia” abordando a definição do que é ideologia e nos apresenta também alguns caminhos pelos quais a ideologia burguesa passou até chegar a seu estágio atual e explica que, para ela, ideologia é um conjunto sistemático e encadeado de ideias de forma que essa ideologia representa um ideário histórico, social e político que oculta à realidade e que esse ocultamento aponta uma forma de assegurar e manter a exploração econômica, a desigualdade social e a dominação política.
         Marilena introduz seus conceitos remontando ao pensamento filosófico da Grécia Antiga sobre o que ocasiona o movimento do ser. Em seguida, faz uma analogia à teoria das quatro causas de Aristóteles, afirmando que são mais importantes as causas de permanência e menos importantes às causas de mudança ou movimento. Ela afirma também que a teoria da causalidade no mundo moderno, reforçada pelos pensamentos de Galileu, Bacon e Descartes, foi reduzida a apenas duas causas: a eficiente e a final.
          As quatro causas explicam a permanência e o movimento ou mudança, um aspecto fundamental da teoria da causalidade que consiste no fato de que as quatro causas não possuem o mesmo valor. A teoria das quatro causas faz distinção entre dois tipos de atividades: a atividade técnica – poiésis e a atividade ética e política – práxis.
          De acordo com Chauí, a física moderna trouxe-nos a possibilidade de explicar o corpo humano pela anatômica e fisiologicamente. Com o objetivo de representar uma máquina natural e impessoal que obedece à causalidade eficiente surgiu o homem como um ser peculiar que será valorizado pela ética protestante tornando-se um indivíduo moderno. Além do homem burguês descobre-se outro; o trabalhador livre.
         O homem mescla-se em dois diferentes tipos de homens; o burguês, proprietário privado dos meios de produção e há o trabalhador, despojado desses meios e dessas condições de trabalho. Os trabalhadores "livres" fazem parte da natureza, enquanto os burgueses constituem a sociedade.
         Marilena Chauí diz que o idealista considera o real como ideias ou representações e que o conhecimento da realidade se reduz ao exame dos dados e das operações de nossa consciência ou do intelecto, como atividade produtora de ideias que dão sentido ao real e o fazem existirem para nós. Para o empirista a realidade é um puro dado imediato e para o idealista um dado da consciência. A autora Chauí ressalta que a história não é sucessão de fatos no tempo, nem o progresso das ideias, mas o modo como homens determinados criam os meios e as formas de sua existência social que se transformam em econômica, política e cultural.
          Para Marilena Chauí a história é o real, e o real é o movimento incessante pelo qual os homens em condições indesejáveis instauram um modo de sociabilidade e procuram fixá-lo em instituições determinadas, além dessas fixações sociais os homens produzem ideias pelas quais explicam e compreendem sua própria vida individual, social, suas relações com a natureza e com o sobrenatural. Nas sociedades divididas em classes e também em castas essas ideias são reproduzidas e difundidas pela classe dominante com intuito de legitimar e assegurar seu poder econômico, social e político.
         A autora Marilena Chauí descreve como surgiu o termo ideologia; o termo ideologia aparece pela primeira vez em 1801 no livro de Destutt de Tracy, Elementos de Ideologia. Foi o Destutt de Tracy que elaborou uma teoria sobre as faculdades sensíveis, responsáveis pela formação de todas as nossas ideias: querer (vontade), julgar (razão), sentir (percepção) e recordar (memória). Destutt de Tracy pertencia ao grupo de pensadores que eram: antiteológico, antimetafísico, críticos a toda explicação sobre uma origem invisível e espiritual das ideias humanas e inimigos do poder absoluto dos reis, eram também materialistas e pertenciam ao partido liberal e esperavam que o progresso das ciências experimentais, baseadas exclusivamente na observação, na análise e síntese dos dados observados, pudesse levar a uma nova pedagogia e a uma nova moral.
          Em seguida Destutt de Tracy propõe o ensino das ciências físicas e químicas para “formar um bom espírito”, dos elementos de ideologia ele procura analisar os efeitos de nossas ações voluntárias e escreve, então, sobre economia, na medida em que os efeitos de nossas ações voluntárias concernem à nossa aptidão para prover nossas necessidades materiais. O sentido pejorativo dos termos “ideologia” e “ideólogos” vieram de uma declaração de Napoleão que, num discurso ao Conselho de Estado em 1812, declarou: “Todas as desgraças que afligem” nossa bela França devem ser atribuídas à ideologia, essa tenebrosa metafísica que, buscando com sutilezas as causas primeiras, quer fundar sobre suas bases a legislação dos povos, em vez de adaptar as leis ao conhecimento do coração humano e às lições da história. Aponta-se também que tal termo foi empregado por Augusto Comte em “Curso de Filosofia Positiva” e explica sucintamente que, para os positivistas, ideologia era um conjunto de ideias de uma época, em que eles afirmavam que “o poder pertence a quem possui o saber” e que quando as ações humanas contrariassem as ideias, elas seriam tidas como desordem, o que contrariava o lema da sociedade positivista de “Ordem e Progresso”.
          De acordo com Chauí, Durkheim chama de ideologia; um resto, uma sobra de ideias antigas, pré-científicas que ele as considera como preconceitos e pré-noções inteiramente subjetivas, individuais, “noções vulgares”, pois,  considera tal atitude subjetiva e tradicional. Para ele o grande princípio metodológico que permite tratar o fato social como coisa e liberar o cientista da ideologia é: “Tomar sempre para objeto da investigação um grupo de fenômenos previamente isolados e definidos por características exteriores que lhe sejam comuns e incluir na mesma investigação todos os que correspondem a essa definição”. Assim, o fato social, convertido em coisa científica, nada mais é do que um dado, previamente isolado, classificado e relacionado com outros por meio da semelhança ou constância das características externas.

A IDEOLOGIA DA COMPETÊNCIA

          Marilena Chauí afirma que, o Filósofo francês Claude Lefort escreveu a ideologia burguesa como um pensamento e um discurso de caráter legislador, ético e pedagógico que definia para toda a sociedade o verdadeiro e o falso, o bom e o mau, o lícito e o ilícito, o justo e o injusto, o normal e o patológico, o belo e o feio, a civilização e a barbárie. A partir dos anos 30 do século XX houve uma mudança no processo social do trabalho, o trabalho industrial passou a ser conhecido como fordismo, no qual uma empresa controla desde a produção da matéria prima até a distribuição comercial dos produtos. Com o Fordismo foi introduzida uma nova prática das relações sociais, conhecida como a organização no sentido de administrar, racionalizar se for eficiente e como administração científica racional que possui lógica própria e funciona por si mesma. A organização do trabalho industrial dividiu-se em duas novidades: a linha da montagem e a gerência científica.
          Lefort cita na ideologia contemporânea como a ideologia invisível emana diretamente do funcionamento da organização e das chamadas “leis do mercado”. A ideologia da competência domina pelo descomunal prestígio e poder conferidos ao conhecimento científico e tecnológico e o discurso competente é aquele proferido pelo especialista que ocupa uma posição determinada na hierarquia organizacional. Na outra modalidade o discurso da competência é privatizado refere-se aquele que ensina enquanto indivíduos privados e não enquanto sujeitos sociais ao relacionarmos com o mundo e com os outros. Os dois discursos foram construídos para assegurar 02 pontos indissociáveis do modo de produção capitalista: a existência da racionalidade nas leis de mercado; e que só há felicidade na competição e no sucesso de quem vence a competição.
         A ideologia tem a função de dar aos membros de uma sociedade dividida em classes uma explicação racional para as diferenças sociais, políticas e culturais, sem jamais atribuir tais diferenças à divisão da sociedade em classes, a partir das divisões na esfera da produção. é a de apagar as diferenças como de classes e de fornecer aos membros da sociedade o sentimento da identidade social, encontrando certos referenciais identificadores de todos e para todos, como, por exemplo, a Humanidade, a Liberdade, a Igualdade, a Nação, ou o Estado. Podemos cometer um engano, contrapondo ideologia e crítica da ideologia, e podemos contrapor a ideologia ao saber real que muitos dominados têm acerca da realidade da exploração, da dominação, da divisão social em classes e da repressão a que este saber está submetido pelas forças repressivas dos dominantes (forças repressivas que não precisam ser apenas as da polícia ou as do exército, mas que podem ser sutilmente, a própria ideologia difundida e conservada pela escola e pelas ciências ou filosofias dos dominantes).
         Marilena Chauí ressalta que é indispensável ver na ideologia do sistema capitalista os três tipos diferentes de família (diferentes tanto por sua finalidade como por seu modo de organização), a burguesa, a proletária e a pequeno-burguesa, já não poderiam falar: a Família. Se pudesse mostrar que a família burguesa é um contrato econômico entre duas outras famílias para conservar e transmitir o capital sob a forma de patrimônio familiar e de herança (mantendo a classe) teria que mostrar que é por isso que, nessa família, o adultério feminino é uma falta grave, pois faz surgirem herdeiros ilegítimos que dispersariam o capital familiar, e que, por este motivo, o adultério feminino é convertido, para a sociedade inteira, numa falta moral e num crime penal. Se, por exemplo, pudesse mostrar que a família proletária tem por função exclusiva reproduzir a força-de-trabalho procriando filhos, teria que mostrar que é por isso (e não por razões religiosas e morais, que justamente são ideológicas) que a mulher proletária não tem direito ao aborto decente e nem o direito ao anticoncepcional, a não ser quando, em virtude da modificação tecnológica que leva à automação do trabalho, interessa aos dominantes diminuir a quantidade de oferta de mão de obra no mercado de trabalho. Se a ideologia mostrasse todos os aspectos que constituem a realidade das famílias no sistema capitalista, se mostrasse como a repressão da sexualidade está ligada a essas estruturas familiares (condenação do adultério, do homossexualismo, do aborto, defesa da virgindade e do heterossexualismo, diminuição do prazer sexual para o trabalhador porque o sexo diminui a rentabilidade e produtividade do trabalho alienado), como, então, a ideologia manteria a ideia e o ideal da Família? Como faria, por exemplo, para justificar uma sexualidade que não estivesse legitimada pela procriação, pelo Pai e pela Mãe? Não pode fazer isto. Não pode dizer isto; porque a ideologia não tem história, mas fabrica histórias imaginárias que nada mais são do que uma forma de legitimar a dominação da classe dominante compreende-se por que a história ideológica (aquela que aprendemos na escola e nos livros) é sempre uma história narrada do ponto de vista do vencedor ou dos poderosos que é transformado em único sujeito da história não só porque impediu que houvesse a história dos vencidos (ao serem derrotados, os vencidos perderam o “direito” à história), mas simplesmente porque sua ação histórica consiste em eliminar fisicamente os vencidos ou, então, se precisa do trabalho deles, elimina sua memória, fazendo com que se lembrem apenas.
         Chauí encerra a obra criticando a supremacia histórica dos “grandes homens”, dos “grandes feitos”, das “grandes descobertas”, dos “grandes progressos”, a ideologia nunca nos diz o que são esses “grandes”. Grandes em quê? Grandes por quê? Grandes em relação a quê? No entanto, o saber histórico nos dirá que esses “grandes”, agentes da história e do progresso, são os “grandes e poderosos”, isto é, os dominantes, cuja “grandeza” depende sempre da exploração e dominação dos “pequenos”, Aliás, a própria ideia de que os outros são os “pequenos” já é um pacto que fazemos com a ideologia dominante.
         Com base nos estudos históricos levantados concluímos que a ideologia burguesa pode manter sua hegemonia mesmo sobre os vencidos, pois estes interiorizam a suposição de que não são sujeitos da história, mas apenas indivíduos explorados.

Referência

-CHAUÍ, M. O que é Ideologia. São Paulo: Brasiliense. 2001.

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